Resumo: O monopólio da violência exercido pelo Colonialismo britânico e, posteriormente, pelo Estado sul-africano está muito além da violência física ou simbólica empregadas em sua construção. Ele aparece em quase todas as formas e estratos da sociedade sul-africana, simbolizando um tipo de Estado que não precisa de rosto ou uma única forma de policiamento para levar seus inimigos ao completo aniquilamento. Formado por leis burocráticas e estamentais, censura e um sistema tributário acachapante, os primeiros anos do século XX nos territórios sul-africanos assistiram à implantação de um sistema capitalista e, por seu turno, a necessidade da adaptação de costumes diversos, em contato e em conflitos já de longa data. Assistia-se a uma tentativa de conciliação entre os brancos de origem europeia, ao mesmo tempo em que os europeus se uniram para fomentar suas políticas de ódio e segregação. Para tanto, fazia-se necessário o controle sobre quase todos os aspectos da vida cotidiana, entre eles, as relações dos nativos com os feiticeiros e curandeiros espalhados pelas comunidades em todo o território sul-africano. Numa sociedade, portanto, em que a figura do deus cristão servia tão somente a uma ideia de sustentáculo de ordem, produzir arbitrariamente seu oposto tornara-se objetivo primeiro para garantir o pleno funcionamento de um sistema ordeiro e progressivo, tendo em vista uma ideia de civilidade e equilíbrio social. Essa pesquisa tem por objetivo observar como a violência tornou-se mecanismo decisivo para a repressão de inúmeras práticas cotidianas, sem qualquer justificativa moral ou religiosa, apenas pautada no pleno avanço de um capitalismo de caráter liberal no que será a África do Sul a partir de 1910. Nesse sentido, optei por observar os resquícios deixados pelos conflitos entre bôeres, ingleses, zulus e outros povos africanos na escrita do Relatório da Comissão Sul-Africana para Assuntos Nativos, entre os anos de 1903 e 1905, textos de lei, cartas de clemência, em que se justificam tentativas de alteração da legislação, bem como recortes de jornal e acusações de bruxaria e/ou feitiçaria nos territórios sul-africanos, entre os anos de 1894-1919, entendo-as como formas de manutenção da violência e, igualmente, como formas não de supressão das convulsões sociais, mas como garantias do caos. Construindo, assim, uma imposição de ordem, cujo Império Britânico se torna beneficiário único Ver menos

Abstract: The British Colonialism monopoly on violence, and later, the South African State's, goes far beyond the physical violence or methods employed in its construction. It appears in almost all forms and strata of South African society, symbolizing a type of state that needs no face or a single form of policing to bring its enemies to complete annihilation. Formed by bureaucratic and static laws, censorship, and an overwhelming tax system, the first years of the 20th century in South African territories witnessed the implantation of a capitalist system and, in turn, the need to adapt different costumes in contact and in longstanding conflicts. There was an attempt at conciliation between whites of European origin at the same time that Europeans came together to foment their policies of hatred and segregation. To do so, it was necessary to control almost all aspects of everyday life, including the relationships between natives and sorcerers and healers spread by communities throughout South Africa. In a society, therefore, in which the figure of the Christian god served only an idea of order and sustainability, arbitrarily producing its opposite had become the primary objective to guarantee the full functioning of an orderly and progressive system with a view to an idea of civility and social balance. This research aims to observe how violence has become a decisive mechanism for the repression of countless daily practices without any moral or religious justification, based only on the full advancement of liberal capitalism in what will be South Africa in 1910. In this sense, I chose to observe the odds left by the conflicts between Boers, English, Zulus, and other African peoples in the writing of the Report of the South African Commission for Native Affairs between the years 1903 and 1905, texts of law, letters of clemency, which justifies attempts to change legislation, as well as newspaper clippings and interference by witchcraft and/or sorcery in South African territories between the years 1894 and 1919. I understand these documents as testimonials of a violent state and, equally, not as forms of depression or social upheavals but as guarantees of chaos. Thus, building an imposition of order, of which the British Empire becomes the singular beneficiary Ver menos